Desmaios coletivos em escola de Quelimane causam preocupação em Moçambique
Desmaios frequentes na Escola Secundária de Sangarriveira em Quelimane, na Província da Zambézia, no centro de Moçambique, preocupa estudantes, líderes comunitários e académicos.
O problema é do conhecimento da população que reside nos arredores da escola, no bairro Sangarriveira. As vítimas dos desmaios são maioritariamente jovens do sexo feminino.
Uma das vítimas, que se identificou pelo nome de Ana Jorge, disse à DW África que não tem uma explicação para o acontecimento. “Não sei explicar o que está a acontecer nesta escola, eu só sinto um arrepio no corpo e depois caio. Na minha turma, são sempre frequentes os desmaios. Apenas esta semana foram cinco meninas que desmaiaram. Estamos com medo, mas não temos para onde ir”, afirma.
A Escola Secundária Geral de Sangarriveira é uma das escolas com o maior excesso de alunos em Quelimane. As pequenas salas de aulas comportam mais de 100 estudantes.
“Os casos são muito frequentes. Este ano está pior em relação ao ano passado. Eu não sei dizer exatamente como isso acontece, mas na verdade eu sinto um arrepio no corpo de forma repentina”, acrescentou Joana Estevão, outra vítima dos desmaios, que critica a direção da escola por não resolver o problema.
Um guarda da escola, que preferiu o anonimato, pediu a intervenção do governo local e das estruturas do bairro para analisar esses fatos e evitar que alguns estudantes desistam das aulas por medo.
O estudante Lazito Júlio mostra-se aterrorizado. “Eu socorri pelo menos três colegas da minha turma. Uma delas caiu durante a aula e ficamos assustados. Pensamos que era alguma doença e, depois de algumas horas, ela ressuscitou. Depois de quatro dias, caiu outra. Nós sentimos muito medo, mas se sairmos dessa escola, não teremos onde estudar, porque há carência de vagas nas escolas”, afirma.
Motivo dos desmaios
Para algumas pessoas, o motivo dos desmaios é o fato de a infraestrutura da escola ter sido erguida onde havia um cemitério. Para outras, rituais tradicionais não foram seguidos. O régulo comunitário Júlio Joenta atribui a culpa pelos desmaios à própria Direção Provincial de Educação da Zambézia por não ter honrado com os princípios tradicionais.
“Eu pessoalmente estive lá no dia do lançamento da primeira pedra para a construção da escola, lá para os anos 2011 e 2012. Quando a construção terminou, não houve cerimónias de abertura e nem fomos chamados. Era preciso chamar os anciãos da zona, as autoridades do bairro e fazer uma cerimónia. Nós, líderes, temos essa missão de fazer as cerimónias para as pessoas viverem tranquilamente. Não sabemos se são espíritos. A ignorância da tradição pode ser o motivo do problema”, opina o régulo.
O régulo desmente, no entanto, que os desmaios estejam a acontecer, porque a escola foi construída numa área em que havia um cemitério. “Ali onde foi construída a escola não havia um cemitério. Aquele espaço pertencia a várias famílias. Eu não sei se foram indemnizados ou não. Se não foram pagos isso também pode constituir problema”, diz.
O académico e ativista social Ricardo Raboco analisa os desmaios como uma forma de pressão social a uma cerimónia de evocação aos espíritos dos antepassados.
“É preciso reconhecer o papel ou a autoridade do tradicional dentro de uma comunidade. As pessoas se esquecem, mas quando são assombradas por uma situação elas se lembram da existência deles. Por detrás disso está uma forma de controlo social que esta autoridade tradicional tende a ter sobre a sociedade para reivindicar o seu papel social que, do ponto de vista histórico, foi marginalizado”, explica.
Direção da escola nega ocorrência de desmaios
A diretora da Escola Secundária de Sangarriveira, Paulina Alamo, negou as declarações de que haja desmaios frequentes nas salas de aula. Segundo a docente, nunca houve desmaios naquela instituição de ensino, e os estudantes e os agentes de segurança que afirmam estarem a socorrer os alunos estariam a mentir.
Uma fonte oficial da Direção Provincial de Educação e Desenvolvimento Humano da Zambézia explica que a escola não foi inaugurada, porque foi construída sem obedecer os critérios necessários. Consequentemente, as obras não têm a qualidade exigida.
Para acabar com o problema, o presidente da Associação de Médicos Tradicionais da Zambézia, Ernesto Selemane, aconselhou a direção da escola a realizar uma cerimónia tradicional de culto aos antepassados no local.
Casos semelhantes de desmaios coletivos já foram registados em outros países do mundo. Em 2014, mais de 200 raparigas sofreram com desmaios misteriosos numa escola de El Carmen de Bolívar, no norte da Colômbia.