Barroso: operação-abafa contra Lava Jato agora mira prisão em 2º grau

Ministro diz que antes esse esforço de frear a investigação tinha como alvo as tentativas de restringir o foro especial

Dias depois de votar contra o habeas corpus de Lula no Supremo Tribunal Federal, o ministro Luís Roberto Barroso denunciou o que chama de uma “operação-abafa em curso” contra a Lava Jato.

Ele diz que antes esse esforço de frear a investigação tinha como alvo as tentativas de restringir o foro especial e agora se transformou em luta contra a prisão depois de condenação em segunda instância.

O atual entendimento da mais alta corte do país embasou a sua decisão no caso do ex-presidente petista Luiz Inacio Lula da Silva.

“Essa estratégia mudou para acabar com a execução da pena após o segundo grau. Daí o processo vai começar no primeiro grau e não vai acabar nunca”, afirmou o ministro. “A estratégia foi alterada diante dessa perspectiva de uma mudança do foro.”

Barroso argumentou que essa mudança na atitude dos que querem restringir o impacto da Lava Jato também se deve ao fato de que a restrição ao foro especial se tornou uma “tendência irreversível” no Supremo por ter apoio da maioria dos magistrados ali.

Falando em Cambridge, no estado americano de Masschusetts, onde participou de um encontro organizado por alunos das universidades Harvard e MIT, o ministro disse ainda que há uma “operação profunda e silenciosa” em curso para mudar o sistema penal do país, que antes induzia à prática de crimes.

“Este sistema que só era capaz de punir meninos pobres com 100 gramas de maconha começou a punir, ainda que seletivamente, pessoas que se supunham impunes”, disse. “O sistema penal criou um país de ricos delinquentes, que praticam corrupção sem nenhuma cerimônia e com índices mínimos de punição.”

O ministro, abusando de citações filosóficas e literárias, disse que imagina um “raio de luz patriótico” no futuro do país e aludiu ao polêmico tuíte do general Eduardo Villas-Bôas ao dizer que “a fotografia da nossa democracia é ruim, mas o filme é bom” e que “alternativas à democracia” seriam piores.

“Ninguém deve demonizar a política”, afirmou. “Não queremos alternativas nem militares, nem tecnocratas nem uma polícia política. Do mesmo modo que não se deve criminalizar a política, não se deve glamorizar o crime.”

DODGE

No mesmo debate, Raquel Dodge, a procuradora-geral da República, também defendeu o cumprimento da pena depois da condenação em segunda instância, lembrando que o Supremo já se manifestou quatro vezes a favor da medida, e que isso serviria para acabar com o que chama de “impunidade seletiva”.

“Esse sistema de recursos torna infinito um processo”, disse Dodge. “A Justiça costuma atingir rápido os que não podem pagar bons advogados, em geral pessoas pobres que ficam encarceradas por longos anos, mas atinge muito lentamente os que têm recursos para manter um processo aberto e que impedem que a pena seja cumprida.”

Dodge disse ainda que um dos fatores que vêm mudando esse quadro é a pressão da opinião pública, em especial com a Operação Lava Jato. “O Judiciário é hoje um ator muito conhecido dos brasileiros”, disse.

“As pessoas sabem quem são os juízes, sabem talvez escalar a composição do Supremo melhor do que a seleção brasileira. Elas querem entender porque decidem daquele modo, em tal sentido, e não de outro. E criticam quando não ocorre o resultado que esperavam.”

JOBIM

Nelson Jobim, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, culpou a imprensa por criar na população a impressão de que a corte seria conivente com a impunidade se mudar o entendimento sobre a prisão depois de condenações em segunda instância.

“Se a imprensa continuar a insistir nessa perspectiva, vocês fazem a mentalidade deles. Se vocês insistirem, todo mundo se convence neste sentido”, disse Jobim a jornalistas, no MIT, onde participa de debates organizado por alunos.

“Sempre fui favorável ao trânsito em julgado por causa da Constituição e foi o que discutimos na época da elaboração da Constituição.

“Ele criticou também a ministra Rosa Weber e a presidente da corte, Cármen Lúcia, que votaram contra conceder habeas corpus a Lula.

Na visão de Jobim, Lúcia não poderia decidir sobre o caso do ex-presidente antes de o Supremo julgar o mérito de uma ação declaratória de constitucionalidade, que pode mudar o entendimento da corte e voltar a instituir a prisão só depois de exauridos todos os recursos de um caso.

“Ela deveria levar a matéria a pauta, ela se negou a levar, o que foi um erro, um equívoco, tanto é que deu essa problemática toda”, disse Jobim. “Agora vai ter uma situação curiosa. Se o presidente Lula vai preso, aí vem o julgamento da ADC e diz que não, aí solta o Lula de novo.”

Sobre o voto de Rosa Weber, Jobim afimou que, caso o entendimento do Supremo mude no futuro, seu voto contra o habeas corpus teria criado uma “situação estranha”.

O ex-ministro ainda disse que o país sofre com uma escalada do ódio que impede o diálogo político.

“Qualquer tentativa de diálogo é criminalizada, como se tudo tivesse uma criminalização da conduta”, afirmou. “Precisamos baixar a temperatura. Temos que tirar o ódio e botar na gaveta. É um acerto de contas do país com o futuro.”

*Com informações da Folhapress.

João Alberto

Jornalista: DRT 0008505/DF. Radialista, Escritor e Poeta

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